No número 207 da avenida Rodrigues de Freitas, no Porto, o Praça da Alegria FC faz esta semana tantos anos quantos os da democracia e integra um triângulo com a Faculdade de Belas Artes e a Biblioteca Municipal.
Há 40 anos que a sede está naquele edifício e hoje conta com uma vitalidade que poucos dos fundadores imaginariam que viria a ter. As Belas Artes “invadiram” o clube do Bonfim, nas palavras de um dos jovens membros da direção, e não mais abandonaram uma comunidade necessitada de energia.
“É um clube bom”, declara o atual tesoureiro e membro do clube há mais de 30 anos, António Castro, com ênfase na última palavra, que soa ao único adjetivo necessário e possível no meio de pelo menos 100 pessoas, entre jovens da faculdade vizinha e figuras septuagenárias cuja vida se entrelaça com a do 'Praça', fundado por um grupo de amigos em janeiro de 1974 num café da dita praça da Alegria, nas Fontainhas.
Inácio Neves era um jovem solteiro de 19 anos quando chegou ao Praça da Alegria FC em 1974 e envergou a camisola do clube durante outros tantos até uma lesão no joelho pôr fim ao percurso de desportista. "Os meus filhos foram criados aqui", diz.
A seu lado, a mulher, Alexandrina Neves, ri-se e conta as noites passadas a fazer toalhas, depois de dias em que trabalhava numa fábrica, as madrugadas de bifanas para angariar fundos, a filha que chegou a presidente da agremiação. “Foi uma escrava aqui”, exclama outro dos históricos do clube, que escutava a conversa.
Luís Carlos Silva, mais conhecido como o “Picheleiro”, também fez parte do grupo fundador e recorda os tempos em que disputavam futebol (de 11 e de salão), boxe e atletismo. Questionado sobre as vitórias que mais o marcaram, a hesitação na resposta está à altura das estantes de troféus que recebem qualquer visitante: “Vitórias... Foram várias”.
Ainda assim e para além da medalha de disciplina da Associação de Futebol do Porto em 1978, a história que mais impacto teve em Luís Carlos Silva advém da cerimónia do 25.º aniversário do Praça da Alegria FC, quando, depois de uma fratura exposta que o deixou limitado durante quatro anos, tomou em mãos a resolução de um problema no mastro da bandeira que estava a impedir o avanço do festejo. E por lá trepou.
Chegado ao topo, arranja o mastro da bandeira, onde fica “durante duas horas” porque o resto do pessoal marchou pela rua e lá o esqueceu. Hoje, ri-se e diz, sem dúvidas: “Foi o que mais me marcou nesta coletividade”.
Numa altura em que clubes e associações de bairro – inclusive vizinhos como o Bloco FC - esmorecem, o Praça da Alegria FC transborda com a energia trazido pelas novas gentes. Parte da direção, José Peneda chegou ao clube há cerca de sete anos, enquanto aluno de Design de Comunicação nas Belas Artes.
“Houve uma relação com os alunos da Faculdade que começaram a 'invadir' o espaço da malta mais antiga”, diz José Peneda, numa sequência imparável de atividades que têm preparado e querem continuar a preparar: campeonatos de matraquilhos, os “carrilhões d’Alegria” e até um simpósio de escultura em gesso cartonado.
Peneda diz que querem “congelar o clube neste momento e fazer um levantamento do passado” para que possam discutir o passado e o futuro não só do Praça da Alegria FC, mas também do Bonfim e do Porto.
Luís Carlos Silva não ignora que hoje "há mais sócios estudantes e professores do que pessoas nascidas na zona".
“Política” é palavra que só é usada no contexto da frase “Não estamos aqui para fazer política”, mas surge a inevitável questão da habitabilidade da freguesia e do centro do Porto como um todo.
“Estamos a lutar todos por uma coisa: que o Bonfim seja mais habitável. Do Porto fugiu muita gente e agora há que ir buscá-la”, desafia António Castro.
Para além da exposição na Junta de Freguesia do Bonfim até sábado, hoje à noite vai ser exibido um documentário sobre o Teatro Experimental do Porto, havendo até domingo concertos de Jorge Coelho, Sócio 157, O Óbvio Enlouquece, Hitchpop, atuações de DJ e várias outras atividades.