Os antigos árbitros internacionais Duarte Gomes e Marco Ferreira disseram à Lusa que o vídeoárbitro (VAR), introduzido esta temporada na I Liga de futebol, tem muitos aspetos a melhorar na próxima época para se tornar uma "mais valia".
Segundo Duarte Gomes, o balanço do primeiro ano da aplicação do projeto "tem de ser positivo no global”, sendo que a tecnologia provou que é “útil” através das “cerca de 70 decisões revertidas, que são 70 erros graves que não aconteceram, um número elucidativo”, enquanto Marco Ferreira elencou várias decisões acertadas, mas também “erros graves”.
Se “qualquer pessoa percebe que a ferramenta é boa, útil, e importante para a verdade desportiva”, a verdade é que os árbitros precisam de um “trabalho constante de adaptação” e a formação de quem desempenha a função “tem de ser contínua”, reforçou Gomes, numa ideia que reúne a concordância dos dois juízes consultados pela Lusa.
“A tecnologia é positiva, sem dúvida nenhuma, a questão é a forma como poderia ser melhor utilizada do que foi esta época. (...) Talvez o ‘timing não tenha sido o mais correto. Foi uma reação de tudo o que estava a acontecer no futebol português em relação à arbitragem, da parte da FPF, para o ambiente acalmar”, considerou Marco Ferreira.
Na opinião do ex-árbitro internacional, a tecnologia tornou evidente a “inexperiência dos árbitros e de todos os agentes em torno do VAR”, considerando que “não houve boa preparação do quadro de árbitros profissionais para a acolher e tornar numa mais valia para o futebol”.
Depois do “período de adaptação”, que permite “aprender com o erro”, o segundo ano de aplicação do VAR deve ter “um trabalho constante” de formação, “á medida que se forem assimilando processos, como foi acontecendo ao longo desta época, num trabalho muito importante de continuação, com novos árbitros, desafios, e jogadas irrepetíveis que têm de ser preparadas”, apontou Duarte Gomes.
“Os árbitros estão a passar de um paradigma a que estiveram sempre habituados, de pesar o jogo em campo, com lucidez, pressão e a transpiração como fatores, para uma sala em que estão confortáveis, numa posição quase de comentador”, acrescentou, reforçando que a função “requer sensibilidades diferentes” e “um grande árbitro não faz necessariamente um bom vídeoárbitro”.
Para o antigo juiz internacional, um bom vídeoárbitro pauta-se pela “serenidade, rapidez de visualização e qualidade de decisão, analisando com frieza, pragmatismo e coragem”, numa prova de “muita personalidade e caráter” e de especificidades diferentes das de um árbitro principal ou assistente.
Tanto Duarte Gomes como Marco Ferreira, elogiam o “investimento muito importante” da FPF na tecnologia, com o primeiro a elencar uma evolução na qualidade de imagem e de sinal como essenciais.
Outro fator de concordância é a especialização da função de vídeoárbitro, com ambos a defenderem a criação do ramo no futuro próximo, quer através dos árbitros despromovidos, como defendeu Marco Ferreira, ou dos juízes que se forem retirando, apontou Duarte Gomes.
A carreira específica é “inevitável”, considerou Duarte Gomes, que reforçou a necessidade de aplicar “árbitros experientes no ativo e ex-árbitros que vão abandonando a carreira” para continuar, e também explicou que “não choca nada” que juízes despromovidos possam desempenhar a função, desde que “tenham qualidade na análise das imagens”.
O caminho do VAR também passa pela transparência, com a imagem “a passar em breve para o estádio”, apontou Gomes, mas também pela possibilidade de “libertar um pouco os árbitros da pressão de admitirem a opinião de um colega”, referiu Ferreira.
“Sou da opinião de que em todas as situações que o VAR levante dúvidas, o árbitro principal vá ver e assuma a decisão final. (...) Era mais claro e credível, até para o público”, apontou.
Marco Ferreira defende ainda que o “grande investimento e trabalho excecional de Fernando Gomes” na arbitragem e no vídeoárbitro tem de ser acompanhada de uma “alteração profunda” nos quadros do futebol português, devido ao ambiente nefasto em torno do mesmo.
Os setores da arbitragem e disciplina “têm de ser independentes” da Liga de Clubes e da FPF, opinou, para que os clubes não tenham peso na regulamentação do futebol, uma medida que permitiria “tornar a arbitragem mais credível” e baixar o ruído em torno do futebol português.
A edição 2017/18 da I Liga portuguesa de futebol terminou no domingo, com a vitória do FC Porto, que somou o seu 28.º título de campeão nacional.