A contratação do refugiado Francis Kalombo, de 15 anos, como jogador profissional de futebol grego tornou-se o sonho de muitos dos imigrantes e refugiados de Moria, na ilha grega de Lesbos, o maior acampamento da Europa.
A contratação aconteceu em março passado depois de o talento de Kalombo ter inspirado o Governo de Atenas a mudar a lei do Desporto para passar a dar aos refugiados e candidatos a asilo o direito de participar em competições desportivas.
O sonho está sempre presente num campo de futebol, a 10 minutos a pé do acampamento de Moria, repleto de espinhos e flores silvestres, onde imigrantes e refugiados podem esquecer, por alguns minutos, os contentores e as tendas sobrelotadas onde vivem e pensar apenas nos pontapés de canto e em golos.
O Cosmos FC é a equipa dominante, composta por migrantes afegãos e africanos que pediram asilo, mas muitos dos jogadores esperam tornar-se profissionais e deixar o campo criado para limitar a chegada de migrantes e refugiados ao continente.
Kalombo, que usa tranças curtas torcidas como uma coroa, tornou-se uma espécie de celebridade na ilha desde que se juntou ao Aiolikos, uma equipa da terceira divisão cujo nome evoca o Deus vento da mitologia grega.
“Parecia um milagre ... eu não sabia que eles tinham que mudar (a lei) para eu jogar”, disse Kalombo à Associated Press depois de uma sessão de treino no seu novo clube.
“A pressão é enorme porque sou o primeiro refugiado a jogar num clube grego oficial, o melhor da ilha”, admitiu, confessando que a sensação é “muito boa”.
Kalombo nasceu no Congo e o esforço de sua família para chegar à Europa durou mais de uma década, tendo-se mudado primeiro para a África do Sul e depois para a Malásia, a Tailândia e a Turquia.
Ao longo do caminho, Kalombo aprendeu várias línguas e habilidades no futebol e está agora matriculado numa escola grega.
Mais de um milhão de refugiados, muitos foragidos da guerra na Síria e no Iraque, chegaram à Europa em 2015 e 2016, e a passagem ilegal da Turquia para as praias do Norte de Lesbos tornou-se o ponto de passagem mais movimentado durante a crise.
Kalombo viajou em 2017, com o seu pai, médico, e com o irmão mais novo, num barco dirigido por traficantes.
Cerca de 7.000 candidatos a asilo estão atualmente em Lesbos, uma das cinco ilhas gregas perto da costa turca, onde o movimento de refugiados e migrantes foi legalmente restrito nos últimos três anos. A maioria vive no amplo acampamento nas colinas de Moria, em contentores que fazem de casas ou em tendas que abrigam, muitas vezes, mais de uma família.
Desde a assinatura de Kalombo com o Aiolikos, o clube foi buscar outros dois habitantes de Moria, dois candidatos a asilo, de 19 anos, vindos da Guiné-Conacry.
“Estes jovens treinam seis horas por semana e é a única vez em que podem encontrar algum tipo de alívio nas suas difíceis vidas diárias”, explicou Giorgos Patlakas, ex-jogador da seleção sub-20 da Grécia e empresário local, que fundou o FC Cosmos há três anos.
Foi Patlakas quem apelou aos legisladores gregos para mudarem as leis desportivas, e orgulha-se da “reivindicação”. Mas o dinheiro escasseia e o fundador do clube precisa de ajuda.
“Está a tornar-se cada vez mais difícil cobrirmos os nossos custos. Todos os meses andamos preocupados com os pagamentos básicos, com o aluguer do campo de futebol e só temos quatro bolas para jogar e treinar”, lamenta, adiantando que “há 100 pessoas que aparecem regularmente a pedir para jogar”.
Kalombo, que fala inglês, francês, turco e quatro línguas africanas, ajuda Patlakas nos treinos e traduções e espera tornar-se um elemento fixo do seu novo clube, que perdeu por pouco a promoção à segunda divisão da Grécia, nesta temporada.
Não tem a certeza sobre que país gostaria de representar internacionalmente – os seus favoritos são a África do Sul e a Grécia -, mas não tem dúvidas sobre o seu clube dos sonhos: o Liverpool, finalista da Champions League.
Kalombo nasceu um ano antes da última grande vitória internacional do Liverpool, quando a equipa passou de estar a perder por 3-0 no intervalo para a vitória contra o Milan na final da Liga dos Campeões de 2005, em Istambul.
Os jogos e destaques do futebol foram seguidos por Kalombo através da Internet, mas ele escolheu os membros dessa geração de jogadores como seus modelos.
“Gostei do Fernando Torres, é um dos meus jogadores favoritos. Gosto do estilo dele e do Steven Gerrard”, diz Kalombo.
“A final da Liga dos Campeões de 2005 foi um milagre e eu gosto do Liverpool por causa disso. Eles não desistem", concluiu.