Os luandenses acordaram hoje numa cidade com menos trânsito, efeitos da paragem forçada de 15 dias com que o Governo angolano tenta controlar a propagação de Covid-19, mas também mais preocupados e atentos ao evoluir da pandemia.
Na capital angolana, que hoje iniciou uma suspensão de, pelo menos, duas semanas nas atividades letivas, desportivas, culturais e religiosas, bem como de diversos serviços públicos, obrigando muitos cidadãos a ficar em casa, a Lusa constatou a correria de cidadãos para aquisição de bens, sobretudo no mercado paralelo, onde poucos cumprem as medidas de proteção.
Entre a aglomeração considerável de pessoas desprovidas de materiais de proteção no mercado das Pedrinhas, zona dos congolenses, nos arredores de Luanda, desperta a atenção uma minoria com máscaras e/ou luvas, mas todos garantem estar “atentos” ao evoluir da pandemia.
O cenário do mercado a céu aberto, no distrito urbano do Rangel, em Luanda, com vendedoras na berma da estrada e algumas dificuldades no tráfego dos clientes colide com as recomendações das autoridades angolanas sobre a proibição dos aglomerados.
Muitas sabem do perigo que correm, mas argumentam em uníssono que o seu “ganha-pão” passa pelo mercado. “Máscaras, máscaras para nós”, pediam as vendedoras.
Angola regista já três casos confirmados do novo coronavírus, segundo as autoridades, que têm vindo a reforçar o alerta para as medidas de proteção.
Como medidas restritivas para proteção ao novo coronavírus, a agência sede da Empresa Nacional de Distribuição de Eletricidade (ENDE) angolana, começou a atender de forma faseada os seus clientes, em Luanda.
O atendimento faseado originou uma enchente à porta, onde são visíveis letreiros sobre a medida de prevenção contra a covid-19, que os clientes consideram “compreensível” tendo em conta a propagação do novo coronavírus pelo mundo.
“O atendimento está lento, mas penso que a medida é acertada por se tratar de uma doença contagiosa, de fácil transmissão e os cuidados são necessários”, disse à Lusa o estudante José Tchivale, enquanto aguardava na fila.
À espera, há quase meia hora, para aceder ao interior da agência da ENDE, no bairro de São Paulo, em Luanda, esteve também Daniel da Costa César, que “apesar da demora” considerou a medida como “acertada”.
Já a funcionária pública, Maria Elizabeth Nunes, ladeada de mais de 50 pessoas, defendeu quarentena generalizada, referindo que o ideal “é estar em casa” e “não suportar fila para pagar energia”.
Medidas semelhantes foram adotadas na companhia de águas, EPAL-EP, que só autorizava a entrada de dois clientes de cada vez, tendo assinalado no chão o local onde deveriam colocar-se.
Em frente à agência do Banco Bic na avenida Alameda Manuel Van-Dúnem, vários clientes perfilavam-se também, aguardando serem atendidos, face às medidas restritivas de controlo de acesso por agentes de segurança e que obrigam à higienização das mãos à entrada, uma prática verificada nas farmácias, restaurantes e outros estabelecimentos comerciais hoje visitados pela Lusa.
“Atendendo à situação que estamos a viver, já nem dá para ter pressa, [há] menos pessoas lá dentro e por isso é que estamos aglomerados aqui fora”, afirmou Hebo Carlos, com máscara de proteção ao rosto.
Domingas da Costa vende pequeno-almoço na rua. Com a “indispensável” máscara de proteção, contou à Lusa que hoje o seu trabalho correu “mais ou menos” devido ao reduzido número de clientes, “responsabilizando” a covid-19 pelo decréscimo.
Lamentos pela falta de clientes surgiram também do moto-taxista, Adriano Lourenço, referindo que as pessoas “estão com o receio de contágio” ao circular de motorizada, conhecida localmente como “kupapata”.
“O nosso dia-a-dia está parado devido ao coronavírus e isso fez parar o nosso trabalho”, atirou.
Por seu lado, a farmacêutica Angelina Marcolino Vionga assinalou que o estabelecimento onde trabalha, na avenida Deolinda Rodrigues, centro da capital angolana, não tem material de higiene e proteção há quatro dias.
“O dia-a-dia está mau, porque há muita procura, não há álcool gel nem álcool, os depósitos não têm nada disponível, as pessoas têm de andar debaixo do sol, à procura. Há muita carência, e onde há é muita enchente”, apontou.
Uma outra farmácia, na Maianga, disponibilizava ainda luvas e álcool gel aos clientes que se encontravam no local, praticamente todos em busca deste tipo de materiais, mas também já não tinha máscaras.
No hipermercado Jumbo, um dos mais antigos de Luanda, não há rotura de 'stock', mas a procura de alguns dos principais produtos de consumo, como a água, o arroz e o vinagre, usado também como desinfetante, aumentou. Em alguns locais, já vai rareando a lixívia.
Segundo contou à Lusa fonte próxima da gerência do estabelecimento comercial, a superfície teve de “impor limites” aos clientes devido às “elevadas quantidades” que estavam a ser adquiridas.
Um outro supermercado da cidade estava também a racionar a quantidade de água, determinando que cada cliente só poderia adquirir dois conjuntos com seis unidades de litro e meio em cada compra.
O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de 386 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram cerca de 17.000.