Uma comissão de acompanhamento, criada pelo Governo cabo-verdiano, vai fiscalizar a concessão do transporte marítimo de passageiros e carga atribuída à CV Interilhas, liderada pela portuguesa Transinsular, conforme determinação a que a Lusa teve hoje acesso.
De acordo com um despacho conjunto dos ministros da Economia Marítima e das Finanças, de 09 de março, mas publicado apenas na segunda-feira em Boletim Oficial, a “melhoria dos níveis de serviços prestados no que se refere às ligações marítimas interilhas é uma das prioridades do Governo de Cabo Verde”.
“É de fundamental importância a constituição de uma comissão de acompanhamento da concessão de Serviço Público de Transporte Marítimo Interilhas, com capacidade especializada de natureza técnico-operacional, económico-financeira e jurídica”, justifica o mesmo documento.
Esta comissão de acompanhamento será coordenada pela Direção-geral da Economia Marítima e vai integrar ainda elementos do departamento jurídico do Ministério da Economia Marítima, representantes dos ministérios dos Transportes e das Finanças, bem como do Fundo Autónomo de Desenvolvimento e Segurança do Transporte Marítimo Interilhas.
Uma das atribuições desta comissão é “analisar e autorizar os investimentos e nível de gastos operacionais realizados ou a realizar pela concessionária”, assim como “assegurar a correta aplicação dos recursos financeiros” por parte da empresa.
A CV Interilhas, detida em 51% pela portuguesa Transinsular (Grupo ETE), iniciou operação em agosto de 2019, tem sido visada por fortes críticas da oposição cabo-verdiana, à alegada falta de transparência na atribuição da concessão, por 20 anos, e por queixas, sobretudo nas redes sociais, de passageiros descontentes com o serviço, apesar do crescimento acima de 20% do número de passageiros transportados e da inclusão de novas linhas face ao modelo anterior, em que vários operadores funcionavam isoladamente.
No parlamento, a oposição tem reiteradamente pedido a anulação do contrato de concessão, alegando incumprimento da operadora.
A missão da comissão de acompanhamento inclui “ainda promover a plena execução das atividades constantes no contrato concessão”, bem como “observar o efetivo cumprimento das cláusulas contratuais, assegurando o cumprimento dos requisitos técnicos e da qualidade dos serviços prestados” e “promover o registo completo e adequado de não conformidades pela concessionaria, de forma a facilmente solucionar as não conformidades identificadas”.
Neste despacho conjunto, o Governo justifica que a concessão, atribuída em concurso público internacional, visou “garantir a unificação do mercado nacional”, tendo introduzido uma “nova dinâmica à economia com a criação de novas oportunidades de negócio e investimento”.
“A necessidade e complexidade de acompanhamento global do Contrato de Concessão do Serviço Público de Transporte Marítimo Interilhas é incontestável”, lê-se ainda.
A criação desta comissão de acompanhamento surge numa altura de nova polémica, depois de o Governo ter aprovado a antecipação do pagamento da indemnização compensatória do Estado, de 2020, à CV Interilhas, perante as críticas da oposição e a justificação do Executivo com as consequências da pandemia de covid-19.
“Há menos gente a circular, há ilhas ainda com grande potencial humano e que estão no quadro da emergência, a taxa de lotação será reduzida para fazermos face à contingência. Tudo isso vai fazer pesar sobre o balanço da empresa e vai ser o Estado, os contribuintes todos, a pagar como é evidente”, afirmou o vice-primeiro-ministro, Olavo Correia, em 13 de maio, questionado pelos deputados, no parlamento, sobre este pagamento.
A Lusa noticiou em 01 de maio que o Governo cabo-verdiano autorizou o pagamento de 100 milhões de escudos (900 mil euros), à CV Interilhas, concessionária dos transportes marítimos de carga e passageiros, como adiantamento de uma parte (três meses) da indemnização compensatória do Estado.
Para conter a pandemia de covid-19, as ligações interilhas de passageiros foram suspensas em 29 de março. As ligações marítimas foram parcialmente retomadas apenas em 11 de maio, nas sete ilhas sem casos ativos da doença.
“Fizemos isso no quadro da lei e com total transparência e quando as contas forem fechadas nós faremos a devida regularização em relação ao valor adiantado para viabilizarmos a operação da empresa”, garantiu ainda o vice-primeiro-ministro, questionado pelos deputados da oposição sobre essa decisão.
A resolução autoriza o Fundo Autónomo do Desenvolvimento e Segurança dos Transportes Marítimos a efetuar o “pagamento da indemnização compensatória à Concessionaria” no montante correspondente ao primeiro trimestre de 2020, “das atividades operacionais” da empresa.
No primeiro trimestre de 2020, de acordo com dados da empresa pública Enapor, os portos cabo-verdianos movimentaram 289.799 passageiros, um aumento superior a 20% face ao mesmo período de 2019 e apesar de já em março, devido à pandemia de covid-19, terem sido suspensas todas as ligações entre as ilhas, com a declaração do estado de emergência no país.