Um grupo de trabalhadores da Casa da Música defendeu hoje que a administração «não teve vontade» de resolver o problema de falta de rendimento de alguns setores, gerada pela crise da covid-19, reiterando que o «tratamento foi diferenciado».
Numa audição conjunta das comissões de Trabalho e Segurança Social e da de Cultura e Comunicação, após requerimento apresentado pelo Bloco de Esquerda, seis trabalhadores da Casa da Música do Porto - sendo um pertencente ao quadro e cinco a recibos verdes - acusaram a administração, assim como a direção artística da instituição, de falta de diálogo, e falaram em "pressões e represálias".
"Não se trata de dinheiro, mas de vontade (...). Só pedimos uma solução que vá ao encontro de uma solução ética. É necessária vontade", disse Fernando Pires de Lima, trabalhador do quadro da Casa da Música.
Fernando Pires de Lima foi um dos 92 subscritores de um abaixo-assinado, com data de 18 de abril, que foi tornado público no dia 28 do mesmo mês, o qual relatava a existência de várias dezenas de trabalhadores a recibos verdes que ficaram sem qualquer remuneração pelos trabalhos cancelados, na sequência das medidas de contingência, devido à pandemia da covid-19.
A esse abaixo-assinado seguiu-se uma vigília silenciosa, a 01 de junho, data que coincidiu com a reabertura da Casa da Música, tendo sido noticiado, no dia seguinte, com base no depoimento de uma das pessoas visadas, que cerca de 13 trabalhadores "precários" foram dispensados dos concertos que tinham sido alocados para o mês de junho.
O mesmo trabalhador contou à Lusa, a 08 de junho, que a Casa da Música tinha decidido recuar na decisão de dispensar assistentes de sala, mostrando-se "surpreendido" pela dispensa anunciada no início de junho, mas "mais surpreendido ainda" pelo 'volte-face' da Casa da Música, atribuindo-o a "alguma pressão da comunicação social".
Hoje, um dia depois de também o Conselho de Administração da Casa da Música ter sido ouvido na Assembleia da República, e de terem sido divulgados comunicados de dezenas de trabalhadores dos quadros da Casa da Música, assim como membros da Orquestra Barroca, que se demarcaram-se desta polémica, este grupo de trabalhadores reiterou que existiram "pressões e represálias" e explicaram o porquê de considerarem que as funções, que "uma grande parte" ocupa no equipamento cultural, os constitui "necessidades permanentes", logo "falsos recibos verdes".
André Silva, técnico de palco desde 2005, descreveu as escalas de trabalho, contou que responde perante hierarquias, manuseia equipamento e veste a indumentária da Casa da Música.
"Temos colegas que já voltaram a ser chamados para trabalhos. Curiosamente são colegas que não subscreveram o abaixo-assinado ou aceitaram a bolsa de horas [ferramenta sugerida pela administração a alguns setores para compensar a falta de remuneração]", contou André Silva, que respondia a perguntas sobre perspetivas de diálogo e de futuro.
Já o assistente de sala Hugo Veludo, assim como a guia Teresa Aguiar explicaram que são "o primeiro contacto da Casa com o público", sendo que, nestas funções, afirmaram, "não há nenhum colaborador que, apesar de realizar um trabalho permanente, seja efetivo".
Também trabalhador a recibos verdes, José Vilela, técnico de palco há 15 anos na Casa da Música - tantos quantos os da instituição -, disse depender a 100% da remuneração que este equipamento lhe atribui, enquanto Catarina Valadas, música formadora do Serviço Educativo, afirmou que "foram necessários 30 dias [período que inclui a divulgação do abaixo-assinado] para que fossem criadas para este setor medidas de apoio semelhantes às de outros".
Na terça-feira, o presidente do Conselho de Administração da Casa da Música, José Pena do Amaral, disse aos deputados que, ainda que não reconhecesse uma situação de "falsos recibos verdes, generalizada" na instituição, iria regularizar o que viesse a ser identificado.
"Temos opiniões jurídicas que sustentam isso (...). Existe um inquérito da ACT [Autoridade para as Condições de Trabalho] que vai dizer se existem ou não essas situações de falso recibo verde e, no caso de existir, evidentemente que a Casa da Música terá de corrigir e fá-lo-á sem qualquer problema", disse José Pena do Amaral.
Na próxima semana será ouvida em audição parlamentar a ACT, tendo também sido aprovada, pelos deputados, a audição da ministra da Cultura, Graça Fonseca, pelo mesmo propósito.