O defesa cabo-verdiano Ricardo anunciou hoje a retirada do futebol, admitindo que a suspensão da II Liga foi “determinante” nessa decisão e destacando as subidas à I Liga e o terceiro lugar nesse campeonato como melhores momentos da carreira.
Com cerca de 500 jogos realizados em 21 épocas de futebol sénior, ‘Xerife’, como é conhecido nesse meio, colocou, aos 39 anos, um ponto final na carreira enquanto futebolista recheada de presenças na I Liga e apenas com uma experiência no estrangeiro, ao serviço dos chineses do Shandong Luneng.
“É um misto de tristeza pelo que fica para trás e de alegria pelo que consegui construir. Acima de tudo, o maior sentimento é de alegria por aquilo que consegui construir juntamente com os meus colegas, por tudo o que fiz e porque acredito que sempre tive uma postura digna que pode ter marcado as pessoas”, afirmou durante a conferência de imprensa de despedida, nos escritórios da empresa que o representa, em Aveiro.
Depois de um vídeo com testemunhos de treinadores como Augusto Inácio, Jorge Simão, Paulo Fonseca, Paulo Sérgio ou Vítor Paneira, o agora ex-jogador disse que durante a sua carreira sempre quis, “mais do que vencer, construir algo que também construíram” para si, referindo-se ao pai, um antigo guarda-redes e descrito a Ricardo como “um homem de grande caráter”.
“Ouvir estas palavras em relação a mim e as pessoas recordarem-me desta forma é o meu maior prémio. Nada do que eu ganhei se iguala a este reconhecimento das pessoas sobre aquilo que sou enquanto pessoa e não enquanto jogador. É o que levo da minha recordação enquanto jogador”, sublinhou.
Sobre a última temporada, ao serviço do Feirense na II Liga, o defesa demonstrou “tristeza” não pelo campeonato que não foi retomado – numa altura em que o clube estava no terceiro lugar –, mas sim pela discriminação aos jogadores e clubes da II Liga.
“Houve um tratamento diferente aos jogadores e clubes da II Liga. Entristeceu-me que fosse desta forma. A pandemia foi determinante na minha tomada de decisão em terminar a carreira e foi uma grande tristeza sentir que as coisas tinham de ser desta forma”, lamentou.
A nível desportivo, destacou as duas subidas da II para a I Liga, ao serviço do Beira-Mar (2005/2006) e, mais recentemente, pelo Famalicão (2018/2019), assim como o terceiro lugar conquistado pelo Paços de Ferreira (2012/2013), embora tenha realçado que o melhor “momento da carreira” foi o dia em que pôde treinar com o filho, em Famalicão.
Num passeio pelo passado, acompanhou com “tristeza” a “decadência do Beira-Mar”, clube que representou quatro anos, salientando que vê com esperança que as pessoas se estejam “a mobilizar para devolver à cidade de Aveiro a grandeza do clube”, e destacou também as 18 internacionalizações por Cabo Verde.
“Apesar de não ser nascido lá, foi um sonho porque tive oportunidade de conhecer um contexto que não conhecia e foi um privilégio enorme representar a seleção. Creio que ajudei a construir uma identidade na seleção. Na altura, estava em reconstrução, entrei no contexto de dar um ar novo e penso que contribui um pouco para que as coisas começassem a crescer”, declarou.
Depois de passagens pelo Freamunde, Beira-Mar, Paços de Ferreira, Vitória de Guimarães e Feirense, o futuro de Ricardo ‘Xerife’ vai passar provavelmente pela área técnica do futebol, já que possui o nível três de treinador.
“Gosto da área do treino, sempre fui apaixonado pelo futebol. Os treinadores [que tive] reconheceram em mim uma extensão dentro de campo e eu talvez tenha ambição de abraçar um projeto nessa área. Por agora, preciso de desligar um bocadinho, porque preciso de tempo para mudar o ‘chip’ e depois logo se verá qual será o passo”, contou.
Aos elogios virtuais dos treinadores no ativo, juntou-se a presença de António Ribeiro, antigo jogador do Beira-Mar e treinador adjunto do técnico Quinito, que descobriu Ricardo no início de carreira no Freamunde e levou-o para o emblema aveirense, recordando um atleta que “não era titular absoluto, mas trabalhava para o ser” e uma “pessoa extraordinária, um grande filho, marido e pai”.
“Era um colega extraordinário, um jogador com uma valia para os companheiros, a forma como os incentivava de forma serena, ele vibrava, era agressivo e não virava a cara à luta. Quem jogou ao lado dele, cresceu com ele. Se enveredar pela carreira de treinador ou outra carreira próxima vai triunfar de certeza”, destacou o antigo jogador e treinador que representou também o Vitória de Setúbal nas duas funções.