As farmacêuticas responsáveis por duas das mais promissoras vacinas contra a covid-19 não antecipam dificuldades nas operações de distribuição, mas o armazenamento nos locais de vacinação será mais complexo e as farmácias só estão preparadas para receber uma delas.
Na semana passada, as farmacêuticas Moderna e o consórcio Pfizer/BioNTech anunciaram que as suas candidatas têm uma eficácia de cerca de 95%, colocando-se na frente da corrida à vacina contra a covid-19.
Com estes novos dados, e outros também promissores divulgados entretanto por mais empresas, aumentou a expectativa de uma nova vacina em janeiro, ou ainda antes do final do ano, e começaram-se a discutir os desafios logísticos de uma operação de vacinação em massa.
Em Portugal, o plano de vacinação, que inclui questões logísticas desde a distribuição ao armazenamento, está a ser coordenado por uma ‘task-force’ criada pelo Governo e deverá ser conhecido em breve.
A Lusa falou com as farmacêuticas que têm estado a desenvolver duas das vacinas que já foram asseguradas pela União Europeia, da Pfizer e da Moderna, e nenhuma antecipa dificuldades ao nível das operações de distribuição mundial.
Entre as duas, a candidata da Moderna é aquela que, pelas suas características, impõe menos constrangimentos, uma vez que se mantém estável até seis meses a -20° C, o equivalente à temperatura da maioria dos congeladores domésticos ou médicos.
“Usar temperaturas de congelação entre -25° C e -15° C é um método mais fácil e mais convencional de distribuição e armazenamento do que a ultracongelação e a maioria dos operadores de distribuição farmacêutica já tem a capacidade de fazer a distribuição para todo o planeta nestas condições”, explicou a farmacêutica norte-americana.
O processo de ultracongelação que a Moderna refere é, por outro lado, aquele exigido para a conservação da vacina da Pfizer/BioNTech, que tem de ser armazenada a temperaturas muito baixas, entre -70° C e -80° C.
Mas o consórcio não deixou esta dificuldade sem solução e desenvolveu caixas térmicas especiais, com capacidade até 4.865 doses, que permitem conservar a vacina à temperatura necessária durante 15 dias, através do chamado gelo seco (ou seja, dióxido de carbono em estado sólido).
“Depois, a vacina pode ser conservada durante mais cinco dias no frigorífico entre 2° C e 8° C até ser inoculada”, explicou o diretor-geral da Pfizer Portugal, Paulo Teixeira, acrescentando que as caixas térmicas serão utilizadas pela Pfizer durante o processo de distribuição até aos locais de vacinação.
Aí, porém, o armazenamento desta vacina será mais complexo, considerando o curto período durante o qual pode ficar guardada num frigorífico convencional.
Por isso, sem o recurso à ultracongelação nem todos os pontos que, por exemplo, agora administram a vacina da gripe poderão ter também a BNT162b2 da Pfizer. É o caso das farmácias comunitárias.
“Eu diria que não estará previsto que esta vacina possa ser administrada nas farmácias, até porque a informação que nós dispomos é que a maioria das farmácias não terá a capacidade de ter estes frigoríficos que permitam a conservação até -80° C”, disse Paulo Teixeira, que sublinhou que Portugal tem os equipamentos necessários para que a vacina possa ser conservada noutros ambientes.
A mesma dificuldade não se coloca com a candidata da Moderna, que além de se manter estável a -20° C durante seis meses, aguenta temperaturas mais altas entre os 2°C e 8°C durante 30 dias depois de descongelada e mantém-se estável à temperatura ambiente durante 12 horas.
“Isto permite que o armazenamento possa ser feito na maioria das farmácias, hospitais e consultórios médicos”, explica a farmacêutica numa resposta enviada à Lusa, acrescentando que a mRNA-1273 também não vai exigir qualquer manuseamento especial ou diluição no local “o que facilita a vacinação numa maior variedade de ambientes”.
Definir os pontos de vacinação é uma das tarefas do grupo de trabalho criado pelo Governo, responsável também por definir a estratégia de vacinação, que inclui a identificação dos grupos alvo prioritários, administração e seguimento clínico de resultados e reações adversas.
A respeito da eficácia da vacina, a diretora médica da Pfizer Portugal, Susana Castro Marques, explicou que a terceira fase dos ensaios clínicos, que envolveu cerca de 44 mil voluntários, entre os 12 e os 85 anos de idade, a taxa de 95% anunciada na semana passada foi consistente nas várias faixas etárias.
“Sabe-se também que acima dos 65 anos de idade a eficácia é superior a 94%”, acrescentou, sublinhando também que, entre os 44 mil voluntários, cerca de 41% tinham entre 56 e 85 anos, pelo que “existe muita informação relativamente às pessoas mais idosas.
O coordenador da 'task force', Francisco Ramos, também disse entretanto à Lusa que a proposta apresentada pela DGS "não tem qualquer limite de idade para as pessoas internadas em lares”.
"A existir, será pelas características das próprias vacinas e não por uma escolha de quem tem responsabilidade de decidir quem deve ser vacinado, nomeadamente quem será vacinado numa primeira fase", que abrangerá cerca de um milhão de pessoas, explicou.
Na semana passada, o primeiro-ministro afirmou que o país está preparado para comprar cerca de 16 milhões de doses de três vacinas e, segundo a ministra da Saúde, Marta Temido, uma das primeiras poderá chegar já em janeiro.
Entre as três vacinas, já estão definidas as doses a comprar: numa 6,9 milhões, noutra 4,5 milhões, segundo António Costa, sem identificar os laboratórios. Quanto à terceira, de 4,6 milhões, será a da Pfizer/BioNTech, confirmou à Lusa a farmacêutica.
Tanto a Pfizer/BioNTech como a Moderna já assinaram contratos com a Comissão Europeia para assegurar vacinas contra a covid-19, assegurando para já 200 milhões de doses da primeira (com a possibilidade de acrescentar outros 100 milhões) e 80 milhões de doses da segunda, que poderão ir até um total de 160 milhões.
No caso das duas vacinas, que exigem ambas duas doses por pessoa, ainda não são conhecidos os preços acordados com a Comissão Europeia, mas em agosto o primeiro-ministro prometeu uma "vacinação progressiva, universal e gratuita".
Além destas, A Comissão Europeia já assinou também contratos com a AstraZeneca (300 milhões de doses), a Sanofi-GSK (300 milhões), Johnson & Johnson (200 milhões), e CureVac (405 milhões).