Os membros do Conselho de Segurança da ONU apelaram hoje a um esforço global coordenado na vacinação contra a doença covid-19, alertando que as desigualdades constatadas na fase inicial do processo colocam todo o planeta em risco.
Numa rara videoconferência ministerial dedicada à área da saúde, um tema que normalmente não é abordado pelo Conselho de Segurança, vários chefes de diplomacia, bem como o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) e outros representantes, apelaram a uma maior unidade perante o atual flagelo de proporções globais.
"O mundo precisa urgentemente de um plano mundial de vacinação que reúna todos aqueles que têm o poder, a perícia científica e as capacidades de produção e financeiras necessárias”, frisou o secretário-geral da ONU, António Guterres, numa declaração ao início da reunião.
“O G20 [grupo que reúne as 20 maiores economias do mundo] está bem posicionado para estabelecer um grupo de trabalho de emergência com a tarefa de preparar tal plano mundial de vacinação e coordenar a sua aplicação e financiamento", prosseguiu Guterres, afirmando ainda acreditar que o G7 [grupo dos sete países mais ricos do mundo] “pode criar o impulso necessário para mobilizar os recursos financeiros”.
A referência de Guterres ao G7, que está neste momento sob a presidência do Reino Unido, surge a poucos dias de uma cimeira deste grupo, prevista para sexta-feira.
Entre os 15 membros (permanentes e não permanentes) que compõem o Conselho de Segurança (órgão máximo das Nações Unidas devido à sua capacidade de fazer aprovar resoluções com caráter vinculativo) constam os maiores produtores de vacinas: Estados Unidos da América (EUA), Rússia, China, Reino Unido e Índia.
Vários ministros, como o chinês Wang Yi ou o britânico Dominic Raab, pediram "mais solidariedade e cooperação".
“Devemos encararmo-nos como uma equipa que trabalha contra uma ameaça mortal", declarou o chefe da diplomacia britânica, Dominic Raab, cujo país organizou esta reunião na qualidade de presidente rotativo (durante o mês de fevereiro) do Conselho de Segurança.
“Estamos a lutar contra uma pandemia global" e "ninguém deve ser deixado para trás", insistiu o ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido.
Esta ideia também ficou vincada na intervenção feita por António Guterres, que denunciou “um progresso extremamente desigual e injusto em matéria de vacinação”.
"Apenas 10 países administraram 75% de todas as vacinas contra a covid-19. Enquanto isso, mais de 130 países não receberam uma única dose", frisou.
E advertiu ainda: “Se o vírus se espalhar como um incêndio descontrolado nos países do sul, irá sofrer repetidas mutações (…) com novas variantes mais transmissíveis, mais mortíferas que irão ameaçar potencialmente a eficácia das vacinas”.
E tal cenário, salientou António Guterres, poderá “prolongar consideravelmente a pandemia” e permitir que o vírus “volte a devastar o norte”.
Atualmente com assento no Conselho de Segurança, o México, através do seu chefe de diplomacia, Marcelo Ebrard Casaubon, criticou o que classificou de “injustiça” e de “uma divisão cada vez mais profunda” entre alguns países ricos que “monopolizam as vacinas” e os outros Estados.
“Pedimos aos produtores de vacinas que trabalhem de boa-fé”, afirmou, por sua vez, Ralph Gonsalves, o primeiro-ministro de São Vicente e Granadinas, o arquipélago situado no Mar das Caraíbas que pela primeira vez ocupa um assento no Conselho de Segurança.
Já do lado dos EUA (um dos cinco membros permanentes do Conselho e com direito de veto), o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, anunciou que Washington irá pagar mais de 200 milhões de dólares (cerca de 166,1 milhões de euros) à Organização Mundial da Saúde (OMS) antes do final do mês.
“Este é um passo essencial para o cumprimento das nossas obrigações financeiras” para com a OMS e “reflete o nosso compromisso renovado em garantir que a organização beneficie do apoio de que precisa para liderar a resposta global à pandemia”, declarou o chefe da diplomacia norte-americana.
Entre os diversos participantes na reunião também esteve a diretora do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Henrietta Fore, que defendeu que “neste esforço histórico” também devem estar incluídos “os milhões de pessoas que vivem ou fogem de conflitos e de cenários de instabilidade".
De acordo com Dominic Raab, estas pessoas são atualmente "mais de 160 milhões” em todo o mundo.
Nesse sentido, o chefe da diplomacia britânica anunciou a apresentação na ONU de um projeto de resolução que apela a um cessar-fogo temporário nas zonas de conflito para permitir a vacinação, texto que Londres espera ver adotado em breve.
A pandemia da doença covid-19 provocou pelo menos 2.419.730 mortos no mundo, resultantes de mais de 109,4 milhões de casos de infeção, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.
A doença é transmitida por um novo coronavírus (SARS-Cov-2) detetado em dezembro de 2019, em Wuhan, uma cidade do centro da China.