Fernando Veiga Gomes, advogado especialista em direito do desporto, prevê que a luta entre os clubes fundadores da Superliga e a FIFA e a UEFA resulte num «caos judicial» que pode abalar a estrutura do futebol.
Em entrevista à agência Lusa, o advogado refere que apesar de todos terem opinião sobre o tema, mais ou menos apaixonada, o que está em causa tem uma base legal que, de um lado e do outro, apresenta argumentos juridicamente válidos.
"Juridicamente a questão é muito interessante, apaixonante até. Há muita coisa a discutir, como questões muito complexas de direito da concorrência, direito europeu, de abuso de posição dominante e monopólio por parte da UEFA e da FIFA. Por outro lado, temos as entidades europeias e os tribunais, que sempre consideraram o desporto como tendo um regime de exceção, não devendo ainda esquecer que estão em cima da mesa regras relativas a princípios como a liberdade de trabalho ou liberdade de associação", frisa o especialista.
A juntar a este "imbróglio", Fernando Veiga Gomes lembra também que entre os fundadores da Superliga estão clubes de países que estão na União Europeia, mas também emblemas ingleses que pertencem ao Reino Unido, que acaba de sair da UE.
"Em que medida é que certos processos judiciais se lhes poderão aplicar?", questiona o advogado, que não tem dúvidas de que também os governos nacionais vão ter de tomar posição e que serão vários os tribunais a julgar este processo, a começar pelo Tribunal Arbitral do Desporto (TAS), onde os fundadores da superliga já terão feito chegar providências cautelares que ‘travem' as sanções anunciadas pela UEFA e pela FIFA.
Sobre essas medidas, o especialista acredita que é possível os clubes serem de facto banidos das provas da UEFA, mas vê como "mais difícil" que estas se alarguem aos atletas.
Já sobre os efeitos do anúncio desta competição, Fernando Veiga Gomes tem a certeza de que nada ficará como dantes.
"Este avanço dos clubes que fundaram a Superliga põe em causa o sistema piramidal do futebol, toda a organização fica em causa e, com isso, o monopólio da FIFA e da UEFA. Estamos numa fase preliminar, com as partes a mostrarem os dentes. Daqui em diante parece haver dois caminhos: isto vai servir para os clubes negociarem melhores condições e haver um novo acordo, ou avançarem com a Superliga para depois desvalorizar a Liga dos Campeões e mais tarde chegar a um acordo", antecipa o especialista, que recorda que o precedente da Euroliga de Basquetebol pode servir de comparação, "embora num nível económico que não tem nada a ver".
No domingo, 18 de abril, AC Milan, Arsenal, Atlético de Madrid, Chelsea, FC Barcelona, Inter Milão, Juventus, Liverpool, Manchester City, Manchester United, Real Madrid e Tottenham anunciaram a criação da Superliga europeia, à revelia de UEFA, federações nacionais e vários outros clubes.
A competição vai ser disputada por 20 clubes, 15 dos quais fundadores - apesar de só terem sido revelados 12 - e outros cinco, qualificados anualmente.
A UEFA anunciou que vai excluir todos os clubes que integrem a Superliga, assegurando contar com o apoio das federações de Inglaterra, Espanha e Itália, bem como das ligas de futebol destes três países.
Entretanto, o organismo que rege o futebol europeu anunciou o alargamento da Liga dos Campeões de 32 para 36 clubes, a partir de 2024/25, numa liga única, com cinco jogos em casa e outros tantos fora.