O Conselho Federal de Medicina do Brasil foi processo na sexta-feira em 60 milhões de reais (9,6 milhões de euros) por danos morais coletivos após indicar o uso de fármacos sem eficácia contra a covid-19.
A ação civil contra o Conselho de Medicina foi entregue pela Defensoria Pública da União (DPU) brasileira (advogados oficiosos), que entendeu que o órgão deve ser responsabilizado pela indicação do uso de medicamentos sem eficácia contra a doença causada pelo novo coronavírus, como cloroquina e hidroxicloroquina.
Na ação, a DPU apontou que o posicionamento do Conselho Federal de Medicina foi contrário ao do Conselho Nacional de Saúde e do Conselho Nacional de Farmácia, que se mostraram preocupados com o uso dessas substâncias no tratamento da covid-19.
Além da indemnização coletiva de 60 milhões de reais, a ação também pede indemnizações individuais a familiares dos pacientes que foram tratados com esse tipo de medicamentos e que acabaram por morrer.
Os advogados oficiosos, que argumentam que a atuação do Conselho Federal de Medicina contribuiu para o agravamento da crise sanitária no país, pedem ainda que o órgão "oriente ostensivamente a comunidade médica e a população em geral sobre a ineficácia de cloroquina e hidroxicloroquina no tratamento" da covid-19.
O uso de fármacos sem eficácia ou sem comprovação científica contra a doença, como cloroquina, hidroxicloroquina, azitromicina e ivermectina, vem sendo amplamente defendido pelo Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, praticamente desde o início da pandemia.
A cloroquina, por exemplo, é um remédio usado contra doenças como malária e lúpus, mas que é ineficaz contra a covid-19.
O Presidente brasileiro, que assumiu ter sido infetado pelo novo coronavírus em julho de 2020, declarou à época que tomou o medicamento e atribuiu-lhe a responsabilidade pela sua cura.
A venda desses medicamentos disparou durante a pandemia no Brasil após o chefe de Estado apelar ao seu uso.
No mês passado, em pleno discurso de abertura da 76.ª sessão da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Bolsonaro defendeu a autonomia médica para receitar esse tipo de drogas.
“Desde o início da pandemia, apoiamos a autonomia do médico na busca do tratamento precoce, seguindo recomendação do nosso Conselho Federal de Medicina. Eu mesmo fui um desses que fez tratamento inicial. Respeitamos a relação médico-paciente na decisão da medicação a ser utilizada e no seu uso ‘off-label’[fora da bula]”, afirmou Bolsonaro.
“Não entendemos porque muitos países, juntamente com grande parte da ‘media’, se colocaram contra o tratamento inicial”, acrescentou, na ocasião.
Após as declarações públicas de Bolsonaro a favor desse tipo de tratamento, a companhia de seguros de saúde brasileira Prevent Senior foi colocada sob investigação por suspeitas de ter ocultado mortes de pacientes que terão sido usados como cobaias num estudo para testar a eficácia da hidroxicloroquina, associada à azitromicina, para tratar a covid-19.