O porta-voz do Governo guineense considerou hoje que a greve geral do setor da saúde foi uma decisão política do sindicato, que está ao serviço do Partido Africano para a Independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde (PAIGC).
“Esta greve não passa de uma greve política, não há razões de fundo que sustentem esta greve”, afirmou Fernando Vaz, que também é ministro do Turismo, em entrevista à Agência Lusa.
Desde 20 de setembro que o país regista uma greve geral, “por tempo indeterminado”, iniciada por médicos e pessoal de apoio, que paralisou os hospitais e centros de saúde na Guiné-Bissau.
Entre outros pontos, o pessoal médico reivindica o pagamento de salários e subsídios em atraso, o seu enquadramento efetivo no chamado Estatuto de Pessoal de Saúde e melhorias nos centros de atendimento aos doentes de covid-19.
“Esta greve é uma greve política” num momento em que o “primeiro partido da oposição deixou de fazer oposição. O próprio líder [Domingos Simões Pereira] prefere estar em Portugal e é o sindicato que faz a oposição na Guiné-Bissau”, acusou Fernando Vaz.
Para o ministro, os sindicatos estão ao serviço do PAIGC, o maior partido da oposição. O “regime de partido único, que vigorou durante a Guiné nos seus primeiros 30 anos”, tinha um “braço armado que eram as forças armadas” – que, entretanto, se tornaram “republicanas” - e “tinha os sindicatos” como um “acessório político do partido único e para onde enviava os seus homens de confiança”.
“É essa a organização que hoje tem a coragem de abandonar os doentes no meio de uma pandemia”, afirmou Fernando Vaz, salientando que o “Governo não deve um mês de salário aos funcionários”.
“O sindicato disse-nos que não estavam a fazer greve, mas estavam a fazer um boicote”, explicou o ministro, recordando que este executivo “pagou dois meses de salários em atraso” quando tomou posse.
“Este foi o Governo que mais investiu no setor da saúde” e só “em obras no nosso hospital de referência, que é o hospital Simão Mendes, foi feito um investimento recorde que nunca havia sido feito”, referiu, dando vários exemplos: “Hoje, os serviços de saúde dão roupas, colchões, lençóis e refeições aos doentes, “coisa que antes não acontecia”, um esforço “feito no meio da pandemia da Covid-19”.
A principal central sindical do país “quer um aumento do salário mínimo de cem por cento. Em que país do mundo é que um sindicato vai negociar um aumento do salário mínimo em 100 por cento? Isto só na Guiné-Bissau”, resumiu o ministro, que responsabiliza o PAIGC pelo atraso do país.
“O processo democrático emerge de um regime ditatorial de partido único, em que as pessoas eram fuziladas publicamente”, apenas porque “tinham uma opinião diferente”, sublinhou.
Com a “abertura democrática”, o PAIGC apresentou-se como um partido democrático. “Essa mesma gente passa a ser democrata”, ironizou Fernando Vaz.
A constituição, detalhou o ministro, era um “fato à medida” do então líder do PAIGC e Presidente do país, João ‘Nino’ Vieira, dando-lhe poderes para presidir ao Conselho de Ministros e a dissolver o parlamento, sem que tivesse que justificar a decisão.
“Todos estes ingredientes fizeram e constituíram instabilidade” dos primeiros anos da democracia, com sucessivos golpes militares, acrescentou.
No entanto, reforçou Fernando Vaz, há “dez anos que a Guiné não tem golpe de Estado”. Apesar disso, “uma greve, uma contestação, qualquer oposição que levanta mais a voz é vista como um sinal de insegurança ou de crise”, mas hoje, a Guiné-Bissau “vive em paz” e é “se calhar, um dos países mais seguros de África”, salientou Fernando Vaz, que minimizou o estigma de um narcoestado ou de um estado falhado.
Isso “está no passado”: “houve pessoas acusadas”, mas o “Estado da Guiné-Bissau não comercializa droga” e as questões que existiram, como detenção de dirigentes ou a apreensão de muitos quilos de cocaína disseram respeito a “questões particulares” e não às organizações que representam o país, assegurou o porta-voz do Governo.