O regulador europeu já aprovou seis medicamentos para tratar a covid-19, considerados fundamentais para controlar a pandemia, mas especialistas médicos e farmacêuticos consideram que esses fármacos não vão substituir as vacinas.
“Estes medicamentos não substituem a vacina, mas vão complementar o combate à pandemia, através de terapêuticas antivirais específicas”, adiantou à Lusa o pneumologista Filipe Froes, que coordena o gabinete de crise da Ordem dos Médicos para a covid-19.
A Agência Europeia do Medicamento (EMA, na sigla em inglês) aprovou, desde o início da pandemia, seis medicamentos para tratar a covid-19, está a avaliar pedidos das farmacêuticas para introdução no mercado de outros três e tem um décimo fármaco ainda em fase de análise contínua.
De acordo com Filipe Froes, estes antivirais e anticorpos monoclonais neutralizantes destinam-se a reduzir o risco de formas graves de covid-19, sobretudo, em doentes imunodeprimidos e com incapacidade de montar uma resposta imunológica suficiente através da vacina.
O médico manifestou-se ainda esperançado que “seja possível implementar a utilização nas próximas semanas” dos tratamentos que já receberam `luz verde´ da EMA, apesar da previsível grande procura mundial.
“O grande problema é a escassez relativa em face da procura e a necessidade criteriosa de utilizar estes medicamentos na população que mais beneficia”, referiu o especialista em medicina intensiva, ao avançar que estes medicamentos são, muitas vezes, adquiridos no âmbito de processos centralizados, o que permite a sua disponibilização a Portugal, à semelhança do que aconteceu com as vacinas.
“Quanto mais cedo tivermos possibilidade de utilizá-los, melhores serão os resultados e melhor será a sua relação de benefício”, salientou.
Segundo o especialista, é também necessário ter em conta, em particular no caso dos anticorpos monoclonais neutralizantes, a sua eficácia perante as novas variantes do vírus SARS-CoV-2.
Por outro lado, “a vantagem dos medicamentos orais é que, em teoria, terão atividade contra todas as variantes conhecidas até agora do SARS-CoV-2”, referiu.
De acordo com o médico, estes fármacos, alguns dos quais utilizam tecnologia que já estava a ser desenvolvida muito antes da pandemia e que foi agora atualizada, terão de ser, nesta fase, usados com critérios definidos a nível central pela Direção-Geral da Saúde.
Já para o farmacêutico José Aranda da Silva, antigo presidente do Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed), a informação científica disponível indica que os fármacos para tratar a covid-19 “não são ainda medicamentos que eliminem totalmente a infeção, como aconteceu com os medicamentos para a hepatite C aprovados há alguns anos”.
“Pelos dados tornados públicos, esses medicamentos serão úteis em diversas fases da doença, o que permitirá um melhor controlo dos doentes infetados, mas não me parece que erradiquem a infeção”, disse à Lusa o especialista em farmácia, para quem é ainda necessário “aguardar serenamente” por mais dados da investigação.
De acordo com Aranda da Silva, a descoberta de um medicamento que erradicasse a doença secundarizaria o papel das vacinas, mas, dado o “caráter pandémico da infeção, as vacinas serão ainda necessárias para prevenir as consequências mais graves da infeção, nomeadamente em populações mais vulneráveis”.
“As entidades públicas nacionais e internacionais, como Organização Mundial da Saúde, a Agência Europeia do Medicamento e o Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças, deveriam ser mais pró-ativas, através das suas comissões de peritos, no sentido de identificar as reais necessidades terapêuticas nesta fase”, defendeu o farmacêutico.
Aranda da Silva adiantou ainda que, para além dos medicamentos, está a ser desenvolvida uma nova geração de vacinas, com “bons resultados nos ensaios em curso”.
Trata-se de vacinas com um fabrico mais simples e com menores exigências de conservação, que recorrem a uma plataforma de vários peptídeos sintéticos (pequenas proteínas) que provocam uma melhor resposta imunitária do organismo e que poderão “atuar de forma mais eficaz nas novas variantes”, explicou.
Desde junho de 2020, a EMA deu autorização de uso nos países da União Europeia para os medicamentos Kineret (imunossupressor da farmacêutica Orphan Biovitrum), Regkirona (anticorpo monoclonal da Celltrion Healthcare Ungary), RoActemra (imunomodulador da Roche), Ronapreve (anticorpo monoclonal da Roche), Veklury (antiviral da Gilead Sciences) e Xevudy (anticorpo monoclonal GlaxoSmithLine).
Já com o pedido das empresas farmacêuticas formalizado na EMA para a autorização de comercialização condicional estão os fármacos Lagevrio (antiviral da Merck Sharp & Dohme desenvolvido em colaboração com a Ridgeback Biotherapeutics), Olumiant (imunossupressor da Eli Lilly Nederland) e Paxlovid, este último um antiviral oral desenvolvido pela Pfizer.
Ainda em fase de avaliação contínua, um instrumento regulatório para acelerar a análise de um novo medicamento em situações de emergência de saúde pública, está o Evusheld, uma combinação de dois anticorpos da AstraZeneca AB para a prevenção da covid-19 em adultos.
Além destes processos de avaliação de medicamentos específicos, a EMA está a colaborar com vários laboratórios e farmacêuticas na investigação e desenvolvimento de cerca de 80 potenciais fármacos para tratar a covid-19, uma fase preliminar e que poderá resultar num pedido posterior de autorização de introdução no mercado.
A EMA é a entidade responsável pela avaliação científica, supervisão e monitorização da segurança de medicamentos na UE, trabalhando em rede com milhares de especialistas de toda a Europa, distribuídos pelos vários comités científicos.