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Sporting: Adán, de gavião a melrinho

Artigo de opinião de Gil Nunes.

Sporting: Adán, de gavião a melrinho
Sporting CP

O exercício é simples e o resultado espreita a unanimidade: Diogo Costa e Trubin, de momento, oferecem garantias muito superiores do que aquelas que Adán oferece ao Sporting. Ponto. Nem será preciso realizar-se um referendo. Mas a questão é outra: de que forma é que o Sporting convive com a situação, sendo que inclusive a mesma já se vem deteriorando temporada após temporada?

Sim, porque Adán foi um dos esteios do último Sporting campeão. É certo que a defesa jogava mais baixa mas o guardião espanhol realizou intervenções decisivas que garantiram a solidez necessária para o fim de um jejum de 19 anos. No entanto, se há três temporadas Adán era o inexpugnável, hoje ele é o ponto mais fraco dos leões. Numa situação que se vem agravando dia após dia. De fissura a cano roto e, atualmente, a uma inundação completa que coloca a equipa toda de galochas. E Rúben Amorim já percebeu que, por muito que o pretenda proteger, não há muito a fazer. Contra o Benfica jogará Franco Israel. Depois logo se verá.

Adán. Diante do Rio Ave, dois erros graves (leitura dos tempos, ou não, de saída) fizeram soar o alarme. Ou, arriscando, quase um autêntico estado de sítio. No caso do segundo erro, para além da asneirada que provocou o derrube de Aziz e o consequente 3-2 para os visitados, o foco da análise reside na reação do guarda-redes. Se errar é humano e errar de forma grosseira também só acontece a quem lá está, o que é censurável é a reação do guarda-redes à chegada do próprio erro: um desconcertante e excêntrico esbracejo típico de quem está dentro dos postes há meia dúzia de dias. A emoção, a reação emocional, ultrapassa a própria baliza da tolerância ao erro e faz a dúvida ecoar na cabeça de um treinador que quer acreditar, mas não pode. Erros que ardem e ainda por cima que se veem. Que toda a gente vê.

Talvez tenha sido o “calcanhar de Aquiles” dos leões. Ou não. Se queremos tornar a equipa competitiva há que contratar de forma precisa. Investir naquele jogador – Gyokeres – que dissipará todas as dúvidas na frente de ataque. E não há torneiras de ouro em Alvalade. Se reforçamos o setor A então o B terá de ficar para outras núpcias. E o setor B dá pelo nome da baliza. Com um paralelo que pode ser estabelecido e que vai ao encontro das características de Franco Israel: muito rápido, com excelente leitura da profundidade e arrojado nas saídas, encaixa que nem uma luva naquilo que se necessita. Tal como Gyokeres, que parece ter sido filtrado em longas madrugadas de requisitos. Ou seja, o Sporting contrata exatamente aquilo que precisa de acordo com um plano gizado no seguimento da análise das carências e de que forma as mesmas podem ser suplantadas de vez quando o jogador é colocado em campo. E sem banco ou bancada de retorno possível.

Porque a experiência não existe em embalagens. Nem em cápsulas. Nem nas prateleiras do supermercado. A posição de guarda-redes é extraordinariamente específica na sua génese e, por conseguinte, mais vale continuar-se na dúvida do que estarmos sempre a trocar de peça. A utilização de Franco Israel nas taças internas é um teste de fogo e um passo de cada vez. É certo que tudo seria contrariável se o Sporting contratasse um Trubin: que custa muito dinheiro e, no caso, o bom é inimigo da minúcia. Devidamente potenciado, Israel encaixa que nem uma luva naquilo que o Sporting pretende, sobretudo num perfil de três centrais quase médios onde o guarda-redes tem de ser um autêntico líbero. Paciência e tolerância para com Adán. Justifica-se. Porque vêm aí diamante lapidado.

Mesmo que continuem a chover picaretas de golos. Dizem que os guarda-redes dos grandes intervêm duas ou três vezes de forma eficaz e evitam que o perigo se robusteça. Acontece que o guarda-redes do Sporting é facilmente batível e, pior do que isso, casa perfeitamente com a estatística: Adán é, atualmente, o guarda-redes da Europa que menos remates defende dentro da sua área. Grave.

E mais grave é o facto da tendência continuar descendente. Se, na temporada passada, o Sporting perdeu no Dragão porque o fator guarda-redes fez a diferença, nesta temporada o cenário agudiza-se num contexto em que a equipa do Sporting defende de forma impecável, concedendo escassíssimas oportunidades de golo aos adversários. Do outro lado da moeda está o Adán que foi decisivo para o Sporting ultrapassar o Arsenal em Londres. Aquele que Rúben Amorim tenta recuperar a todo o custo. O nosso Adán. Afinal de contas, se consegues ser decisivo em Londres também o consegues ser de forma regular nas contas cá do burgo. Vale a pena sonhar e tentar cimentar o sonho.

O perigo está à espreita. Porque a insistência em Adán poderá culminar numa montanha de incoerência. Ora, se Rúben Amorim exige consistência a Eduardo Quaresma para lhe atribuir uma titularidade regular, então não pode haver regimes de exceção para ninguém. Sim, é certo que a posição de guarda-redes tem razões que a razão desconhece. Mas, mesmo assim, a água da incoerência pode colocar em causa a habitabilidade do edifício. Ou então Franco Israel chega ao final da sua caminhada e, sorridente, diz aos presentes que o desafio da maturação foi concluído com êxito. E, a partir de agora, todos os tempos são seus.

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