Artigo de opinião de Gil Nunes.
É um dos jogadores em foco no FC Porto desta temporada: Galeno. E com uma versão goleadora que tem vindo a ser aprimorada ao longo dos tempos no minucioso e paciente laboratório do Olival. No fundo, espremer o alcance de um elemento de elevado potencial e dotado de características físicas interessantes: relativamente alto (1,79), rápido e com capacidade de finalização aprimorada. Base de trabalho rica e diversificada.
Pode ser simplista. Mas, no caso, o simples adequa-se àquilo que se pretende. Se marcas golos em arco a trinta metros da baliza, também o consegues fazer dentro da área. E até com maior facilidade. Tens é de estar no sítio certo à hora certa e, naturalmente, o processo não se constrói sozinho. Os espaços geram-se de acordo com as dinâmicas da equipa, que se adaptam a um adversário débil neste ou naquele ponto. Como aconteceu diante do Benfica que, muito embora o panorama coletivo dos encarnados seja razoável para não dizer sofrível, é uma equipa de tremenda qualidade em termos individuais. E que acarreta cautela máxima a toda a hora.
Há um processo de “ronaldização” contido dentro de uma nuvem de frieza que nos traz de volta à terra num ápice. Galeno não é CR7 nem tal se pretende. Agora, é mais conveniente tê-lo em zonas de finalização do que fora delas, até porque as próprias movimentações de Pepê e de Evanilson (sobretudo deslocações deste último = segundo golo diante do Benfica) providenciam a cratera necessária para Galeno explorar. E finalizar. Como também aconteceu na primeira parte diante do Arsenal, que só não desaguou em golo por manifesta infelicidade.
Seja como for, o pensamento é sequenciado. Por etapas. O que Galeno apreendeu em Braga é para manter e solidificar. Com Carlos Carvalhal. Numa defesa a três (seja por referência ou por altura de jogo) é vital possuir um ala que saiba recuar e ajustar-se à linha de cinco defesas, protegendo a transição defensiva e, também por sequência, que seja capaz de acelerar quando a equipa recupera a bola. E, ainda por cima, quando o jogador está devidamente preparado para o duelo defensivo e para a marcação concreta dentro de um espaço que conhece bem. Ou seja, a promoção do exagerado processo de “ronaldização” não invalida tudo aquilo que está para atrás. Que está consolidado.
Dizer que Galeno só rende diante dos tubarões não é um mau rótulo. De facto, por muito que o concreto possa e deva ser trabalhado, os grandes jogadores aparecem nos grandes jogos e o incrível desempenho nesse tipo de partidas é muito mérito do próprio e da capacidade emocional que demonstra. E, puxando a linha à seleção nacional, a entrada de Galeno nas escolhas de Martinez providenciará a peça que está em falta: elemento habituado a explorar espaços amplos, agressivo na profundidade, e de extrema utilidade quando as seleções adversárias não apresentarem defesas tão baixas e condensadas. Perfil dos tais tubarões. É certo que se pode argumentar que a abundância reina nas contas da seleção, e que para entrar Galeno terá de sair outro, sendo que o tal outro terá sempre estatuto. No caso, trata-se de uma opção particular: o diferente, às vezes, vale mais que o bom. Sendo que no caso diferente e bom são compagináveis dentro do mesmo jogador: Galeno. Que traz consiga uma vasilha repleta de pormenores de ouro. E de rotinas assimiladas.
Se o euro 2016 resultou de um conjunto de variáveis, de entre as quais se destacava as rotinas do meio-campo do Sporting (William Carvalho – Adrien Silva – João Mário), há situações do jogo que positivamente podem ser transplantadas do clube para a seleção. Como a articulação entre Diogo Costa e Galeno. Que já valeu um golo monumental diante do Bayer Leverkusen (temporada passada) e um conjunto de situações de perigo que beneficiaram os dragões. E que podem também beneficiar a seleção, assim a mesma se adapte a tal articulação nos momentos decisivos.
Todavia, e voltando à marca “Galeno e tubarões”, o mesmo pode ser injusto. E incompleto. Veja-se o que aconteceu diante do Santa Clara: o segundo golo dos dragões adveio de uma movimentação coletiva em que a presença ao segundo poste de Galeno culminou com finalização precisa e típica de quem tem golo no ADN. Agora, o desafio passa por tornar situações deste tipo regulares em qualquer contexto de jogo, destacando a multifuncionalidade de Galeno como o seu atributo mais evidente. E não o jogador que aparece diante de Arsenal e Benfica para resolver em golpe de inspiração pura.
Se jogador diferente é sempre apetecível, a sua renovação obedeceu e bem à máxima da prudência. E, de uma forma contida, podemos traçar um paralelo em relação àquilo que aconteceu com Luis Diaz: a potenciação do colombiano em zonas centrais permitiu um grotesco salto em termos de rendimento e, claro está, a sua afirmação como jogador de elite. Sendo que seis meses antes da explosão era o suplente mais utilizado dos dragões. Galeno e Diaz – diferentes entre si – assumem um semelhante caminho de desenvolvimento. E com golos no menu. Espetaculares e regulares.