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Portugal: carruagem em abóbora às 90 badaladas

Artigo de opinião de Gil Nunes.

Portugal: carruagem em abóbora às 90 badaladas
Federação Portuguesa de Futebol

Foi uma posse de bola superior a 70% e a clara insistência num processo ofensivo que esbarrava de frente com uma muralha checa (sobretudo linha de cinco defesas) preparada para tornar o seu castelo inexpugnável. Duas questões saltaram à vista: de facto, o melhor Portugal surgiu após o inesperado golo do adversário; depois, também a Chéquia percebeu desde cedo que não tinha argumentos para enfrentar Portugal. David em Praga e Golias em Lisboa.

Se o onze inicial de Portugal surpreendeu? Sim, sem dúvida. Desde logo a colocação de Nuno Mendes como central do lado esquerdo, para se aproveitarem as características do jogador em termos de aceleração e progressão. Com uma premissa em cima da mesa: as ligações maduras entre Nuno Mendes e Rafael Leão, com eficácia comprovada no passado. E um respaldo de pensamento: será que Rúben Amorim não faz o mesmo com Matheus Reis no Sporting? É que os jogadores de top são plásticos e não vêm destinados a esta ou aquela prateleira. Este ou aquele setor do campo. Por aí nada a dizer.

Martinez até adivinhou

O que mais surpreendeu foi a ausência de um médio-defensivo assumido e a opção pela colocação de Vitinha mais nessa esfera de ação. No caso, Martinez até adivinhou: percebeu que os checos dificilmente iriam causar perigo pelo miolo (em posse) pelo que o perigo pontificava mais nos corredores. Onde Portugal se povoou e, aí sim, se tomou a opção mais surpreendente: Cancelo como defesa no processo defensivo e como médio quando a equipa atacava - também em zona interior e com predominância para chegar rapidamente a zonas de definição.

Não foram 45 minutos pastelões mas, ainda assim, as picadas de Portugal estavam a ser escassas para tanta consistência em termos de posse de bola. Se Leão procurava o desequilíbrio mas numa zona muito exterior, o lado direito do campo apresentava um jogador em sub-rendimento: Diogo Dalot. Esperava-se mais do lateral, sobretudo no ataque ao espaço na altura da finalização, principalmente quando a equipa canalizava muito do seu jogo para o lado contrário – atração e variação rápida para o flanco direito que não estava a resultar.

Aliás, o golo checo partiu de Dalot (falta de timing no ataque ao portador) e de um meio-campo exageradamente recuado na altura do bloqueio da linha de tiro. Mas há males que vêm por bem: a seleção portuguesa reagiu e as alterações de Martinez foram certeiras: em 3x5x2 o selecionador puxou Bernardo para o miolo, canalizou Cancelo para a direita e, na frente, fez a alteração que se justificava: Diogo Jota ao lado de Ronaldo, com ordem mais para se atacar pelo meio. E Jota, refira-se, é aquele cujo perfil natural mais se articula com as características de Ronaldo, puxando o letal CR7 para o seu casulo de finalização. Onde deve estar.
Portugal foi mais efetivo, mais produtivo, e chegou ao empate numa dinâmica muito parecida àquela que o FC Porto utiliza com Zaidu em campo (golo diante do Vitória em Guimarães): arrastamento para o lado direito com cruzamento e entrada de rompante do lateral esquerdo em ataque ao espaço. É certo que a Chéquia teve mais espaço para apostar na profundidade, mas a solidez dos centrais revelou-se a necessária para se conter a ausência de um médio-defensivo ou, de forma mais simples, do João Palhinha de serviço.

Entra-se agora no campo da discussão filosófica. Qual o melhor timing para se realizarem as substituições? No início? No fim? Nunca se sabe. Mas há contextos que podem ser aproveitados. E contextos cuja História dá ares de si: em 2014 Portugal jogava o futuro da qualificação em Copenhaga e, perto do fim e com o marcador a zero, Fernando Santos realizou uma mudança arriscada: tirou Tiago e lançou Quaresma, retirando a equipa do 4x4x2 e colocando-a num 4x3x3 que se revelou certeiro logo de seguida.
Porque substituições nos últimos minutos não são fetiches. São decisões estratégicas. Ora, se o adversário está nos limites da fadiga e necessariamente com índices de concentração mais baixos, e se o jogo tende para a natural anarquia final, a opção por oferecer ao jogo referências completamente diferentes (até excêntricas) pode resultar em cheio. E Portugal foi por esse caminho: aceleração brusca através de Neto e um contra um oferecido por Francisco Conceição, e também mencionando Nelson Semedo que é muito bom a explorar a profundidade.

Sofrido mas controlado. Com o otimismo irritante de Roberto Martinez

As substituições no último minuto podem ser impopulares, mas impõem uma dose de risco relativamente baixa. Naquele cenário, refira-se, dificilmente Portugal perderia o jogo e, na senda das probabilidades baixas, seria sempre mais provável acontecer algo na baliza dos checos. Como veio a suceder para luso contentamento e para mérito de substituições que não caíram do chapéu do capricho ou da fezada. Foram pensadas.

Se a Turquia vai colocar desafios completamente diferentes – tem outras armas do meio-campo para a frente e a colocação de um médio-defensivo de raiz vai ser quase obrigatória – a leitura contextual é fria e avessa a jantares glutões: vai ser sempre assim.

Sofrido mas controlado. Com o otimismo irritante de Roberto Martinez a disseminar-se em forma de alívio: mas o que é que os checos fizeram para obter aquele golo? Quase nada. E em Portugal cai a cortina da ansiedade do primeiro jogo e algumas boas notícias invisíveis: desde logo o desempenho de Ronaldo, sempre muito conectado com a equipa e deixando de lado a componente do individual. Capitão maduro e a prometer euro de excelência. Estreia positiva.

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