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FC Porto: A manta curta ou larga

Artigo de opinião de Gil Nunes.

FC Porto: A manta curta ou larga
Depositphotos

No fundo, Vítor Bruno fez aquilo que lhe competia. Garantir, de forma inequívoca e nem que chovessem picaretas, os três pontos que estavam em jogo diante do Braga e que, acima de tudo, permitem que os dragões cheguem à pausa para as seleções com o sentimento de dever cumprido. Agora é tempo de trabalho e de laboratório. Com toda a serenidade do mundo.

Faça-se a conta: chegados a outubro, os dragões têm uma Supertaça no bolso, um segundo lugar na liga onde só perderam pontos diante de um Sporting que é uma das melhores equipas da Europa, e têm na Liga Europa o seu calcanhar de Aquiles, pois podia ter sido feito mais e melhor. Isto tudo num processo de desenvolvimento onde uma chuva de reforços de qualidade tem de ser retocada sob pena de não passar disso mesmo: um excelente contentor de jogadores. Que não perfazem uma equipa.

A prioridade está em cima da mesa: a resolução do limbo existencial que assola os dragões e que ficou bem visível diante do Manchester United: ou seja, uma enorme dinâmica ofensiva que, na sua corrente, não é completamente protegida na retaguarda, fazendo com que o futebol vertiginoso dos dragões seja representado nos dois sentidos: do espetáculo e do perigo. Equação que nunca resulta em equilíbrio.

É lógico que Samu tem de entrar em cena porque, em termos individuais, aporta o que nenhum outro dianteiro do FC Porto consegue aportar. E o rendimento individual do espanhol tem disfarçado algumas debilidades dos dragões em absorverem o seu ainda corpo estranho. É verdade que Samu pede espaço à sua frente mas, para tal, tudo tem de ser preparado à retaguarda, sem que o grotesco recuo seja evidente e a circulação possa ser efetuada com perigo em zonas mais recuadas. Algo que não é fácil de apreender num espaço de poucas semanas. Até porque a equipa se habituou, no início da temporada, a jogar com Namaso na frente de ataque, num cenário em que a posse e a circulação eram ordem em detrimento da explosão, poderio física e entrada em profundidade. O mundo ao contrário que passou a estar direito.

E, à posteriori, existem as questões orbitais em torno de Samu. Em que momento é que Galeno pode sair da ala (onde mais rende) para aparecer no meio como segundo avançado? Ou, por outro lado, em que momento é que Pêpe pode entrar pelo lado direito e causar desequilíbrio através da sua velocidade de ponta? Sim, porque tal só faz sentido se Samu estiver naquele determinado local. Naquele determinado momento. Ou então de que forma é que os laterais podem ter um papel fulcral na dinâmica ofensiva? Sem que o facto de serem travados, como foram pelo recuo estratégico dos extremos do Braga, emperre e deturpe todo o processo ofensivo.

E a harmonia da transição defensiva é o principal desafio dos dragões neste momento. Porque se o FC Porto ataca como gosta, tudo fica descoberto à retaguarda. Manta que fica larga. Ou então se recua e procura explorar a profundidade, fá-lo em demasia e fica quase como encostado à área. Às cordas. A parte curta da manta. E não deixa de ser curioso: os dragões dispõem de todas as armas para resolver o problema mas ainda se deparam com a questão do equilíbrio dos espaços: uns centímetros mais acima ou mais abaixo e a equipa ou fica demasiado arrojada ou então demasiado tímida. Uma versão híbrida. O limbo existencial.

O problema não é grave. Pelo contrário, é um problema positivo. Pior seria se o quadro fosse de caos e não houvesse identidade. Sim, são dores de crescimento. Sim, são processos que podem ser contrariáveis através do trabalho. Até porque os reforços estão a ser introduzidos no onze inicial algo de rompante, o que naturalmente acarreta atritos que só são eliminados através do erro. Com tempo e espaço para o mesmo erro. Sobretudo num plantel jovem.

As inquietações provêm de um lado direito que está longe de ser fiável. Por um lado, não há como João Mário em termos de canalização do flanco direito, com uma capacidade de desequilíbrio que torna os dragões imprevisíveis e tendentes a “chamar o adversário” para a canhota para, num ápice, variarem o flanco para o lado contrário. Mas, por outro lado, João Mário é o elo mais fraco da linha defensiva. Se, diante do United, tal foi evidente na forma exacerbada como a equipa britânica usou e abusou das entradas pelo seu flanco esquerdo, diante do Braga o amarelo obtido na primeira parte levou à sua troca prematura por um Martim Fernandes que é exatamente o oposto: muito certinho no plano defensivo (até podendo funcionar como terceiro central) mas sem a tal ponta de desequilíbrio que é fundamental num espectro de equipa grande. Ou seja, o complemento é perfeito mas a troca, em termos de estratégia de jogo, é como ir da água para o vinho.

É lógico que, quando a transição defensiva não fica salvaguardada, os centrais ficam sobrecarregados com as entradas dos médios, compensações no corredor e natural proteção da zona central. O Braga, que padece de semelhante problema de equilíbrio defensivo, foi ladino ao colocar os extremos dentro e povoar a sua linha média defensiva com o intuito de emperrar as fontes de alimentação externas e internas a Samu. Que é que os arsenalistas não possuem: todos os dianteiros do Braga ainda são jogadores em fase de formação e sem a qualidade mínima para fazerem esquecer Banza ou Abel Ruiz.

Num FC Porto que foi aritmético e frio, as contas fazem-se no final da liga. Para já interessa o processo e de que forma o mesmo pode ficar maturada. Para Vítor Bruno, a pausa para as seleções vem no momento exato. Tempo de afinar a máquina. Continuar a afinar a máquina.

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