O primeiro ministro britânico, David Cameron, pediu hoje desculpa às famílias das 96 vítimas do desastre de futebol no estádio de Hillsborough em 1989, pela “dupla injustiça” que sofreram.
“Em nome do governo – e do nosso país – estou profundamente triste por esta dupla injustiça que foi deixada sem correção durante tanto tempo”, disse o governante no parlamento, após a divulgação de milhares de documentos, que provam falhas oficiais, juntamente com uma perniciosa ação da polícia, que, forjando evidências e documentos, culpabilizou as vítimas pelo ocorrido.
Cameron falou depois de o Painel Independente Hillsborough, um órgão de sete membros liderado pelo bispo de Liverpool, publicar um relatório do pior desastre desportivo britânico, após revisão de arquivos inéditos.
O desastre foi causado por sobrelotação do estádio na meia-final da Taça de Inglaterra entre o Liverpool e o Nottingham Forest: para aliviar a sobrelotação, a polícia abriu uma porta de saída, permitindo aos adeptos dos “reds” inundar as zonas centrais, mas estes acabaram cercados por outros e esmagados até à morte contra as grades.
O governante provocou reações de consternação dos deputados quando revelou que o painel concluiu que a polícia tentou várias vezes encobrir evidências das suas próprias falhas, com o propósito de culpabilizar os próprios adeptos do Liverpool.
A polícia “alterou significativamente” 164 depoimentos, incluindo a remoção de 116 comentários negativos à sua ação - o político admitiu que “as famílias tinham razão” quando se queixavam de adulterações na condução do processo.
O serviço de assistência médica também falhou, uma vez que teria sido possível reanimar algumas das vítimas, se tivessem recebido tratamento mais cedo, informou.
“Como o peso das novas evidências neste relatório, é apropriado para mim fazer hoje, como primeiro ministro, um adequado pedido de desculpas às famílias das 96 vítimas pelo sofrimento dos últimos 23 anos”, disse David Cameron, acrescentando que “as provas apresentadas deixam claro que as famílias sofreram uma dupla injustiça”.
O governante lamentou “a injustiça dos terríveis acontecimentos - e o fracasso do Estado em proteger os seus entes queridos e a espera indefensável para chegar à verdade”, bem como a “injustiça da difamação dos falecidos, de alguma forma culpabilizados pela própria morte”.
Cameron disse que o procurador-geral teria agora de rever o “profundamente preocupante” relatório para decidir se apela ao Supremo Tribunal para anular o inquérito original sobre a tragédia.
No relatório agora revelado, descobriram-se os esforços da polícia para “desenvolver e divulgar a tese de que os acontecimentos se deveram a entradas sem bilhete, embriaguez e violência”.
O recinto não tinha condições mínimas de segurança, com torniquetes inadequados, a capacidade foi significativamente sobrecalculada e as barreiras de proteção não cumpriam com as normas de segurança.
Um relatório judiciário, de Peter Taylor, revelou que o desastre se deveu a falhas do “controlo policial”.
As famílias das vítimas dizem que é uma injustiça que nenhum indivíduo ou organização tenham sido responsabilizados plenamente pelo desastre.